quarta-feira, 30 de setembro de 2009

DGOF prize "Best Research Thesis Award"

The German Society for Online Research (Deutsche Gesellschaft für Onlineforschung, DGOF) announces its Best Research Thesis Award. The prize has a value of 3000,- Euros. It will be given to students who have finished a thesis (Bachelor/Master/Ph.D.) in 2008 or 2009.

The submission deadline is: December 31, 2009.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Yom Kipur

A última vez em que não jejuei no Yom Kipur foi, se não me engano, em Nova York por volta de 1996. Fiquei no apartamento da Susanna no Upper East Side cozinhando para umas vinte pessoas, entre as quais o Mick e a Naomi e a Andrea Baiana. Estava também a Marla, irmã do cunhado no meu irmão. Era bastante gente. Até o pessoal do Upper East Side cometeu a imprudência de atravessar o Central Park (novaiorquino é muito bairrista) e veio nos visitar.

Desta vez, uma gripinha serviu de pretexto para minhas refeições no dia mais sagrado dos judeus. Mas a verdade é outra: eu não achava que devia jejuar. No fundo acreditava que tinha pagado os meus pecados e pronto. Tomei o primeiro gole de água do dia, à noite, quando voltei da sinagoga, feliz, me achando no direito. O café da manhã foi maravilhoso e sem culpas. Comi cada bocado de fruta e pão, tomei cada gole de leite e suco com um enorme prazer; eu merecia. Só a coxinha frita, feita pela Maria, que a Renata me serviu no almoço me abalou um pouco. Pois quem é que se acha digno de uma coxinha? Mas depois tomei café e ainda levei chocolate para casa.

À tarde havia chovido. Reclamei mentalmente com meu irmão por ter deixado uma janela aberta; tive que enxugar o chão. Mas depois eu mesma, na hora de sair, deixei a janela aberta. Então era melhor deixar por isso mesmo, pois era dia do Kipur e quem é que não deixou, no ano, uma janela aberta? Deitei, li todas as histórias da Morashá do último ano, histórias do meu povo cheio de histórias. Escutei um CD da Fortuna sem saber que ela estaria na sinagoga cantando. Enfim, fiz as rezas do meu jeito.

No dia anterior, na Hebraica, o cantor abriu a cerimônia falando do que ela representava para ele, vir todo ano cantar, a angústia do tempo passando. Depois se perguntou quem pode julgar quem, quem pode decretar se o outro é feliz, quando nossos momentos mais felizes não são mensuráveis nem públicos? E aí agradeceu estarmos todos juntos ali, naquele salão enorme, que já foi caótico e barulhento mas que agora parece tão correto, tão adequado, por mais um ano.

Eu estava muito feliz de estar ali. Me parecia ter atravessado um longo percurso até chegar ali de volta, então estava muito feliz. Somos só uma meia-dúzia, uns poucos judeus que decidiram vir ao Brasil. Se você vai ao exterior te perguntam: mas como é que seus antepassados tiveram essa idéia esdrúxula de ir ao Brasil? E você inventa alguma história que até pode ser verdadeira, mas é mais para mudar o assunto e calar o interlocutor.

Mas temos uma identidade, não? Não somos apenas uns judeus que foram parar num lugar quem nem propriamente latino-americano é, nem apenas uns brasileiros que marcam as festas religiosas em datas estranhas, não é verdade? Temos todos esses laços, com o Brasil e seus vizinhos, com Israel e com os países de onde nossos antepassados vieram, e algum dia ainda vamos entender mais profundamente os nossos laços com os cristãos-novos que para cá vieram - laços como judeus mas especialmente como brasileiros.

À parte esses laços todos, foi bom estar de volta, entre os meus. E eu curti cada momento desse dia, tirando até férias do jejum.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Primeiro Dia de Aula

Então antes d'ontem comecei a dar aulas. Dependendo de como conta, depois de 4 ou 12 meses. Gostei. Há problemas? Claro que há. A faculdade é longe dos grandes centros urbanos e de pesquisa. A gente sente isso. Mas senti garra de conhecer mais sobre o que acontece nesses centros, especialmente na sala de aula propriamente dita.

Outro problema, que eu modestamente já tinha diagnosticado na época da Resolução 3045, que me permitiu fazer uns cursos fora da minha faculdade lá pros idos da 9ª década do século passado, é que as pessoas ainda pensam em termos de disciplina. O conhecimento já é transdisciplinar não é de hoje, você sabe. Então toda aquele conversa de grade curricular - o termo é corretíssimo, é uma grade mesmo - fica um pouco démodé.

Com os alunos é muito divertido, pois eles tentam pensar em termos de grade, mas você nota o esforço, o desconforto. Como se houvesse algo fora do lugar, algo inadequado. Vestindo uma roupa muito justa, ou de tecido muito duro. Estão corretos, pois se as disciplinas deram forma ao conhecimento social na virada do século XIX para o XX, elas hoje são camisas-de-força que as instituições de ponta vão se livrando sem traumas.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Moisés e o Monotransporte

Desci do ônibus pela frente me despedindo do motorista. Eu havia pago a passagem e pedido para o cobrador virar a catraca pois queria continuar o papo, que estava quente.

Tchau, Moisés. Eu sou a Heloisa.

Ele sorriu e perguntou: "Você é escritora?"

Sou, respondi, sem hesitar.

"Tem cara mesmo."

Mas o foco da conversa não tinha sido eu não. Tinha sido o trânsito de S. Paulo. Moisés, que faz a linha Sacomã-Pompéia, inconformado com o treinamento que tinham lhe dado hoje: pare para as bicicletas, nem buzine. Se ele se assustar e cair a responsabilidade é sua. A multa? "Não vai para o dono da empresa", o Moisés falou. Então era só isso o que faltava, andar atrás das bicicletas. "Eu ganho por hora, mas e o passageiro que tem hora marcada no HC, o que eu digo?" Moisés falou o número de pessoas que transporta por dia. "E o Lula achando que o Brasil depende da indústria automobilística e do petróleo, não é assim." Mas é seu conterrâneo, não, Moisés? "Que nada, sou cearence."

Disse com orgulho, era cearence. Fiquei com vontade de ir para lá, ir para um lugar onde as pessoas tem orgulho de vir. Em São Paulo está todo mundo querendo ser americano, havia me dito um rapaz no dia anterior. Não discordei.

Mas o melhor da conversa não foi a política. Foi a técnica. "E por que não fazem um corredor de ônibus? Ah, porque a Paulista vai perder seu charme. Sei, e esses carros todos aí são um charme?" Aí é que entrou a menção ao Lula e a sua visão retrógrada do progresso. São Bernardo anos 70.

Eu acho mesmo que perde o charme, Moisés, eu disse. Mas a faixa esclusiva para ciclista que você falou eu gostei. Podia ser a primeira, a da direita. Depois a dos ônibus, protegendo os pedestres, e depois duas para os carros, como você falou.

Então concordamos, estava resolvido. Por mim, indo até a Lapa. "Onde houver asfalto tem que ter faixa para bicicleta", ele emendou. Radical. "Quando o cara no carro vir que o ônibus anda e ele não, vai de bicicleta ou toma o ônibus."

"Mas você está achando que uma bicicleta ou outra vai te roubar o dia, não é assim. Que custa ficar atrás da bicicleta?" Aí o Moisés revelou: "Eu conheço todos os lados. Sou ciclista, tenho moto, tenho carro e dirijo ônibus."

O pedestre é que sofre mais, eu emendei. "O pedestre é o mais desprotegido, e o mais imprudente", ele me explicou. Deve ver coisas no trânsito de São Paulo.

E agora a lição: "Esses problemas todos de São Paulo, eu estou na rua e vejo. São fáceis de resolver. Mas quem está lá? Quem passa num desses concursos, não sabe nada, nunca tomou um ônibus na vida e vai lá decidir como a gente deve fazer as coisas."

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Ich bin Brüno, dove of peace

O melhor do Brüno é o modo como cheguei lá: peguei o elevador da cobertura até o metrô, subi até a Paulista e em 15 minutos total estava no cinema. Paguei meia entrada. Enfim, vivo num agrupamento humano que posso chamar de cidade.

Achei que ia adorar, me matar de rir. A cena do Brüno num desfile de moda vestindo um macacão de velcro foi realmente gozada. Umas outras também. Mas nada que chegasse perto do Borat. Não que Borat seja melhor, acho que eu que mudei. Borat era a gozação de um estereótipo. Brüno me pareceu muito real.

Entre um filme e outro vi que a busca desenfreada pelo sucesso não é piada. Vi que aqueles agrupamentos em torno de identidades bestas não ficaram tão pra trás assim. Então não ri muito com o Brüno buscando uma causa como quem compra um carro novo. Me doeu. Eu vivi isso.

Adorei a cena com os árabes e os judeus. E depois com o guerrilheiro. Estão mais longe, não sei o que é verdade o que não é, fica "quaint" ver os dois primeiros concordando que homus é bom e o último se segurando para não perder a calma.

Saí de lá pensando que a gente não pode deixar esse cara (Borat diria: esse judeu) vir fazer filme no Brasil. Não pelo que os outros vão pensar de nós, para os outros tudo vai ficar engraçado e fofinho. Mas pelo que a gente, que se conhece bem, vai ver na tela.

domingo, 13 de setembro de 2009

Promessa paga

Em algum momento do ano passado fiz a seguinte promessa: chegando ao Brasil ia fazer um tour pela cidade e agradecer pessoalmente a cada um de meus avós por terem vindo e ficado nesse país.

Era uma promessa de uma perna só; eu não pedia nada em troca, apenas a pagaria. Mas as semanas acabaram correndo depressa: fui ao Rio duas vezes, revi amigos, fiz as feiras do Sumarezinho e da Vila Madalena, recebi minha família de Boston, visitei parentes, prestei concursos, fui ao festival literário de Paraty, encenei a peça Vatapum, escrevi dois artigos acadêmicos, fiz um exame Papanicolau.

Deixei meus avós de lado, um na Vila Mariana e três no Butantã, ao longo desses três meses. Mas hoje, um domingo ensolarado, ia ter uma cerimônia especial na Vila Mariana: o cemitério não estaria, portanto, desolado. Aproveitei e fui.

Deixei meu carro uma quadra acima da entrada. Passei pelo cemitério cristão e o moço me disse que o judaico era mais à frente. Entrei, e desci a rua larga que dá num predinho branco, provavelmente uma sala de rezas. Um pequeno grupo escutava um discurso à esquerda. À direita, zanzei por duas ruas buscando meu avô e bisavô, falecidos quase no mesmo ano.

Eu tinha ido lá para isso; para ver aqueles túmulos adornados por pequenas fotos. Mas quando os encontrei, logo colado à rua principal, me surpreendi. Estavam lá intactos, no mesmíssimo lugar. 1935. 1936. Um pesquisador ia publicar um livro sobre o Cemitério da Vila Mariana, nomes ilustres, gente antiga como diz uma tia minha.

Para preservar a memória.

Mas me espantei. Não tinham mudado nada. Golpes, inflações, mortes na família, estavam lá incólumes. Não sei como estarão seus primos na Venuzuela, mas no Brasil podem descansar em paz.

Havia duas pedrinhas no túmulo do bisavô Schnaider. Acho que foi engano, ele tinha homônimos. Ou será que o tio Isaac esteve em São Paulo? Algum amigo não terá sido. Outro dia encontrei um sujeito que foi colega da tia Polinha, conheceu meu bisavô. Será?

Ainda faltava os bisavós maternos. Rosa e Simon Dranger. Algumas letras caídas, meio mal-cuidados. Mas no mesmo lugar também. Rosa também é minha mãe, e minha sobrinha. Então consegui ver a Rosa e o Simon discutindo em Yidish, as crianças em volta, estão mais vivos. Mas no mesmo lugar.

E, por fim, do outro lado, tia Polinha, que morreu idosa, e tia Raquel, que não conheci, filhas do Jacob Schnaider. As duas com o título de Doutora na frente do nome. A pedra da tia Raquel desenhada pelo meu pai, toda reta, geométrica, nos anos 50. Estive lá apenas duas vezes, mas entrei na ruela certa logo de prima, vai entender.

A primeira parte da promessa eu cumpri. Agora falta o Butantã, vou na semana que vem. Mas acho que não vai haver surpresa alguma.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Uma história antiga

Essa história é bem antiga, e não sei porquê me deu ganas de narrar agora. Agora que está tudo mais ou menos resolvido. Mas lá vai:

Era meados dos anos 70, estávamos no Guarujá com minha avó. Meu pai trabalhava, provavelmente na Ajax, na Via Dutra. Era na época em que ele usava terno. Minha mãe chegou arrasada de S. Paulo, chorando e tudo o mais. Sentou à mesa e desabafou para uma senhora e duas crianças que pouco sabiam sobre política universitária.

A história era essa: haviam reprovado minha mãe no exame de qualificação do mestrado. Não foi falta de preparo; minha mãe entendia dos números, dos volumes e das probabilidades. Isso eu vi com meus próprios olhos, várias vezes, qualquer hora conto. Mas era para outro sujeito passar, e isso era, é, será razão suficiente. Então disseram: "Faltou elegância à sua prova."

E minha mãe engoliu essa: "Faltou elegância."

Mas não digeriu bem; ficou engolido na traquéia, sem chegar ao estômago, sem ser decomposto pelos ácidos que a gente produz e que nos permitem digerir as coisas mais duras.

Então ela catou os exercícios mais espinhosos de estatística que havia disponíveis nos livros, e os fez um por um. Fez todos, com a serenidade com que depois me explicou o que era afinal uma tabela Anova, com a serenidade com que depois interpretou os resultados dos seus exames de sangue, enfim, com aquela sua serenidade que ela reservava para os momentos de maior necessidade.

E num belo dia pediu explicações ao orientador para fazer o primeiro exercício da lista. E ele pediu um tempo para pensar. E na semana seguinte ela veio com o exercício pronto e pediu ajuda para fazer o segundo da lista. E ele pediu um tempo para pensar. E na semana seguinte ela continuou o processo, sempre muito educada, simpática, com seu batom barato que na sua boca ficava muito elegante.

Sempre, sempre muito elegante. Mesmo quando mandamos alguém tomar no cu é preciso manter a elegância, pronunciar bem as palavras e acertar nas concordâncias. Sempre.

Ao som de ABBA

Acordei hoje ao som de ABBA. "The winner takes it all" era a trilha sonora de um sonho, onde eu estava novamente na faculdade onde dei aulas no ano passado nos EUA. Só que o lugar parecia mais uma fazenda, com ovelhas, montanhas, minha família visitando. Coisa de sonho. Eu corria em câmera lenta e encontrei as dirigentes da faculdade.

Aí me deu na telha não falar em inglês com elas. Decidi, no sonho: vou falar só português. Inglês, só na sala de aula. E assim foi.

A idéia não era original, pois no dia anterior tinha escutado a seguinte história:

Um canadense nascido no Brasil vai ao consulado pedir passaporte, pois quer voltar à terra natal depois de 3 décadas fora. A mulher olha seus documentos e pergunta antipática: "Mas você é judeu?" Ele responde: "Não falo português. Fale comigo só em inglês." Ela vai para dentro, e reclama com o superior que havia um judeu pedindo passaporte brasileiro. O superior diz para deixar com ele e atende o moço normalmente.

Então, é isso: em certos momentos, o melhor é dizer que não fala a língua. Ou, em português, "dar uma de Mané".

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

De volta às aulas

Bom, é isso aí. Estou de volta ao blog e às aulas. No ano passado dei aulas?

Não sei, mas agora volto à UNESP, desta vez em Marília. Gente muito simpática, campus comum mas super bem cuidado. Em frente à universidade, atravessando a pista pela passarela, um restaurante onde almoçam os caminhoneiros da região: arroz, feijão, salada, cada dia uma carne diferente, ovo e uma verdura. Excelente, me dá água na boca só de pensar.

O campus todo com internet sem fio; a sala não tem telefone, mas quem é que precisa disso hoje? Então skypeei meu irmão e nos vimos ontem, ele em Boston e eu em Marília. Essa é a última semana de aulas, devido à greve suína, como ele diz. Na próxima semana é férias. E depois, em 21 de setembro, começa o segundo semestre de 2009.

Ainda acho que o professor deve compreender o espaço específico onde vai dar aulas, para que possa ajudar os alunos em seus processos de aprendizado. Mas aos 40 anos a gente está cansada. Então estou procurando entender o espaço onde vou dar aulas mas desviando dos trechos íngremes.

Vou contando aos poucos no blog o que acontece, mas não vou me prender à sala de aula. Se der vontade vou falar de outras coisas também. Preciso, por exemplo, enviar uma receita de macarrão ao funghi secchi para minha sobrinha, pois não deu tempo de fazer aqui e ela pediu.

E quem é que vai me dizer que não há mil ensinamentos numa receita de macarrão?