domingo, 18 de novembro de 2007

"Putaria"

Lembra-se daquela moda das camisetas pretas, com as palavras "dignidade" ou "respeito" escritas em maiúsculas brancas, sem mais nada, como se fossem statements completos? Respeito para quem, e por que? A quem faltava dignidade, a quem vestia, a quem lia a camiseta ou a um terceiro ausente? Camisetas caras, que ficam bem em gente que faz Pilates.

Eu dava aula num dia desses, naquela turma da noite divertida, quando um aluno fez um comentário muito pertinente. Escutei atenta, como sempre, até que caí na risada: "Turma, olha só esse colega de vocês, olha a camiseta dele, vocês viram? 'Putaria', está escrito 'putaria', olha só."

Era também um statement, sem alvo claro. Putaria era o que ele defendia, era o que ele denunciava? Ele retomou o comentário, eu procurei escutar mas disse, citando Goffman, que a incongruência entre seu figurino e seu texto me fazia cócegas. Contei que na minha época as distribuidoras de petróleo, com medo de estatizações, davam adesivos para vidros com os dizeres: "Petróleo, quem distribui também contribui." O DCE da USP lançou a paródia "Cannabis, quem distribui também contribui." Era aquele restinho da idade da ironia, que começa na terceira série do primário, não se se de acordo com Piaget ou comigo mesma, e tem fim indefinido.

Mas se o adesivo da maconha era meio datado, com toda a violência das drogas e coisa e tal, a camiseta da putaria me parecia bem apropriada. Nossas convicções são rasas, condensáveis em poucas palavras e, especialmente, fáceis de virar do avesso.

2 comentários:

Felipe Pait disse...

Petróleo lembra uma camiseta engraçada em inglês, acho que da época de algum vazamento.

"We don't care. We don't have to care. We are Exxon. We are part of the problem."

Bem anglo. Linguagens diferentes.

Anônimo disse...

passei por aqui como aquele cachorro, olhei pra ca' e pra la' e percebi que pelo jeito o recesso escolar acabou.
abs
sgold