segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Pra quem sabe o que é democracia...

...aqui vai um concurso de vídeo:

O DESAFIO
Criar um vídeo de curta duração que complete a frase "Democracia é…"

O PRÊMIO
· Uma viagem a Washington, Nova York e Hollywood com todas as despesas pagas.
· Exibições de gala dos vídeos vencedores em Hollywood, Nova York e Washington.
· Contato com cineastas e a indústria de filmes e televisão dos Estad os Unidos.
· Reuniões com os defensores da democracia do governo, da mídia e da sociedade civil.

O CRONOGRAMA
· PRAZO PARA ENVIO: 31 DE JANEIRO DE 2009
· Os semifinalistas do desafio serão selecionados em fevereiro e março de 2009.
· Um júri independente irá reduzir os semifinalistas a 21 finalistas, de 1 de abril a 15 de maio de 2009.
· O público em geral irá votar on-line nos vídeos vencedores, de 15 de maio a 15 de junho de 2009.
· Sete vencedores – um de cada região: do Hemisfério Ocidental, Europa, Oriente Médio/África do Norte, A África Subsaariana, sul e centro da Ásia, leste da Ásia/Pacífico e um vencedor anônimo - serão anunciados em meados de junho de 2009.
· Em outubro de 2009, os seis vencedores identificados publicamente, um de cada uma das seis regiões geográficas, viajarão para os Estados Unidos para receber o prêmio.

OS DETALHES
· Você deve ter 18 anos ou mais para participar.
· Os vídeos podem ser de qualquer estilo: ficção ou documentário, animação ou de ação.
· Os vídeos nao devem ter mais do que três minutos.
· Os vídeos devem ser em Inglês ou ter legendas em Inglês.
· Competidores podem participar anonimamente, mas os vencedores anônimos não podem ganhar o grande prêmio.
· Veja o site da competição para obter uma lista completa das regras, www.videochallenge.america.gov.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

A Borduna Democrática

Olha só, alguém me escreveu por ter encontrado a Borduna Democrática no Blog. Fui buscar na Web, encontrei esse livro, Memórias Estudantis, http://books.google.com/books?id=DV47De7NjDIC&pg=PA353&lpg=PA353&dq=borduna+democrática&source=web&ots=IRTQAYjUZ_&sig=hUZ1hTsjXX0GA0VGsbWlcunZvhE&hl=en&sa=X&oi=book_result&resnum=2&ct=result#PPA353,M1, que cita uma chapa para a UNE na qual participei, e da qual me lembro apenas, bem, da borduna.
Como a Web é maravilhosa!

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

I miss you too!

To my students at UNESP/Araraquara,

I miss you too!

This country is great, and they've just had this great election process, and I do admire them.

But do I miss Brazil! I even miss your anti-American comments... 'Cause we have fun down there.

Hi to my Santo André students as well, trying to figure out what globalization was, when they are globalization!

Heloisa

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Globalization?

There is no globalization process going on. It is over, and we are all alike throughout the world. Students are the same, they write exactly the same words. I might be the same too.

sábado, 16 de agosto de 2008

What America is About

Now I know what America is about: ontem ao sair da sala vi que todas as luzes do predio ja estavam apagadas. Tateei o corredor ate a luzinha de Exit, e fui para casa comer Thai food de pacote.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Food for Thought

Two dramatic questions occupy my mind here in Pittsburgh. What should I teach? Should I buy nice kitchen utensils? I think I need nice kitchen utensils. After all, I will eat out of them for almost an entire year. There are many books on Brazil in English. I am atordoada with them, but I know that eventualy they will form a lively flow of stories, just like in my previous courses.

I was in Pittsburgh once, but it was dark and I didn't notice it much. I was in the company of friends and family, and it's them, in the end, that we remember.

I am in a country I know well, teaching about a country I know little about. The country I know little about - Brazil is not for beginners, the books say - is my country and I believe I miss it. I believe I miss it, for how can one be sure of feelings when they first arrive?

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Em Pittsburgh

Aqui no Brasil procuro trazer um pouco da experiência da Liberal Arts Education para a sala de aula: o pensar autônomo, pragmático, interdisciplinar, colaborativo. E para Pittsburgh, vou levar o quê?
Vou dar aulas sobre o Brasil, por dois semestres. Aceito sugestões, o que é o Brasil? Como é que se ensina o Brasil?

domingo, 8 de junho de 2008

Relatos

Vá lá entender esses alunos. Ou então o contrário, tão previsíveis.

Então chegou a hora de apresentar os trabalhos, as duas semanas finais do curso. Nas aulas anteriores pouca gente na aula, entre-e-sai, uma coisa bem chata. Mas os trabalhos foram chegando no site, com mais imprecisões que no geral, mas também alguns trabalhos mais propositivos, gostei.

Achei que apenas alguns grupos viessem. Mas não. Todos ali, querendo apresentar. Por que independente do que pensem de mim, tinham uma história para contar. De sucesso, de fracasso. De esperança e de preocupação. De vitória individual e de impotência. Academicamente, com teorias ou sem teorias. Com textos atrapalhados ou claros. Não importa. Tinham uma história para contar.

E quando a gente tem uma história para contar, não é hora de espicaçar o professor nem de defender ideologias ultrapassadas. É hora de deixar a história ser falada, com emoção, com orgulho. Então dei mais um curso.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Eu queria

Ontem tirei o dia para ler textos de amigos: um projeto de livro de uma artista plástica, um artigo sobre o ritual do teatro de uma pesquisadora de teatro, e mais algumas coisas esparças. No jardim do clube anotei comentários no caderno com capa de couro e depois em casa enviei emails. Talvez seja muito íntimo dizer isso no blog, mas eu queria ser uma pessoa que fizesse as coisas que eu faço, desse aulas, escrevesse umas coisas, lesse umas outras.

domingo, 13 de abril de 2008

Não sei mais

Agora não sei mais. A dengue, devemos suspender as aulas? No PCC e na greve fui contra, agora não sei mais. Vale a pena arriscar ser picado para aquelas aulas?

O motim continua, também não sei mais o que fazer. Reclamam se faço concessões, reclamam se não as faço. Bolei exercícios interessantes, busquei explcações. Parece tudo fútil. Parece tudo incerto.

O paradoxo de dar liberdade aos alunos é esse; se eles não gostam da liberdade é difícil ser crítico, é estranho exigir aulas expositivas onde eles não têm lugar. Mas já estou explicando, e na verdade não sei mesmo.

Por que o blog? Também isso não sei.

terça-feira, 8 de abril de 2008

Um Caso Clássico de Conversão

No Mais! desse domingo um relato tão comum sobre um esquerdista arrependido que bem poderia ter sido um recorte-e-cole de outros casos iguais. Com todos os ingredientes de conversão: um olhar acurado sobre a história, uma esposa que não tem papas na língua, uma observação mais atenta sobre o comportamento das pessoas, um cansaço com a mídia de esquerda, umas leituras em economia que nunca caem mal e um rabino sereno que também sempre ajuda.

Li sem interesse, quase por obrigação, não havia nada de novo e muito menos imprevisível.

O único elemento digno de nota era um certo atraso. Lembro que quando o Jarbas de Holanda saiu do PC, contei para meu pai, que me retrucou: "Mas só agora? Fiz isso há 20 anos."

O divertido é uma professora da USP pasma e um ator brasileiro dizendo que a obra transcende o artista. Já desconfiava, mas nunca quis bater o martelo: o pessoal da USP acha que entende mais os autores que os autores. Há no Butantã gente que conhece mais Habermas que o filósofo alemão; mais Heller que a filósofa húngara, e assim por diante. Sobre Mamet, então, o escritor americano deveria dar uma passada aqui no Brasil para, enfim, se entender.

A Borduna Democrática

Imagine que em 1986, se não me engano, entrei numa chapa para a UNE, também se não me engano, com os colegas da FEA do último ano, cujos nomes escapam inteiramente de uma memória que os americanos talvez dissessem "overstretched".

A chapa, tenho absoluta certeza, se chamava "A Borduna Democrática". Era no tempo do Sarney.

Sei que você é um leitor amoroso e perspicaz. Tenho vontade de deixar o texto aqui, pois você já entendeu tudo.

Mas explico: Numa escola como a em que dou aula, que é feita à imagem e à semelhança daquela onde você dá aula, ou ao menos teve aulas, só na base da borduna mesmo é que o povo compreende o que é democracia.

Na base do diálogo eles te demolem. Tem que ser firme, bordunamente.

Eu adorava esse nome, "A Borduna Democrática". Mas para entender, levei 20 anos.

Vaz era um dos colegas, lembrei.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Isso caracteriza orientação

"Professora, queria saber se a senhora pode me dizer o que acha do meu projeto antes de eu entregar, ou se isso caracteriza orientação."

Eu contornei o motim, mas as críticas sistemáticas continuavam e eu já considerava jogar a toalha. Então a pergunta humilde da aluna, seguida a uma semelhante colocada na site, me fizeram pensar. Não bem pensar; mais assim lamentar mesmo.

Então não podia caracterizar orientação? O que eu fazia ali além de caracterizar orientação? Que tipo de abuso intelectual haviam sofrido, para achar que o professor não pode caracterizar orientação?

Eles já haviam relatado alguns abusos: absenteísmo, notas aleatórias, depreciação de suas opiniões. Como leões com espinho no pé, rugiam.

Imaginei a cena: um aluno perguntando ao professor como faz alguma coisa. Sei lá o que. Como pesquisa, como faz entrevista, como interpreta; enfim, essas coisas que faz todo estudante. O professor dizendo o absurdo com palavras pomposas: "Ah, olhe só, não posso lhe dizer isso; caracterizar-se-ia orientação!"

Claro, eu havia dito que os trabalhos seriam acompanhados passo a passo. Claro, o site estava disponível exatamente para isso. Mas há coisas que a gente não escuta, não acredita, pois, afinal, isso caracteriza orientação.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Blogs

Disse a professora de um aluno meu: "Internet lá é objeto de estudo? Só tem bobagem."

De fato, tem muita bobagem. Apareceu um link neste blog para um site de vinhos. Gosto de vinho. Gosto de vinho argentino. Mas com a queda dos preços todo mundo se tornou somellier, e diz no blog: "Nunca segure a taça do vinho pelo bojo." Outro dia uma amiga me falou a mesma coisa: "Nunca segure a taça do vinho pelo bojo." O mundo será melhor quando as taças de vinhos forem seguradas pela haste, e pararem de cortar alface.

A professora é que está certa.

terça-feira, 18 de março de 2008

Mais um motim

Os alunos falaram de todas as suas insatisfações político-pedagógico-metodológico-literário-ético-conceituais ao meu curso, e escutei-os pacientemente por quase uma hora. Justificava serenamente cada atitude questionada. Ao fim, disse, puxa, sabiam que eu não esperava mais um motim na terceira aula, como foi no ano passado?

Eles riram, depois me disseram que a idéia de um motim quebrou o gelo.

Eu me perguntei por que ando indiferente, vendo a classe em polvorosa e enxergando "mais um motim de terceira aula". Sei que ao final vão fazer bons trabalhos e me agradecer, parte envergonhados, parte a contragosto. Essa serenidade, é coisa boa? Ou envelheci?

Mas por que o motim?, me perguntaram as amigas. Bem, em parte sem razão, pois apenas apresentei o curso na primeira aula, discuti um conto de Clarice na segunda e pedi que eles escrevessem uma apresentação pessoal no site para a terceira aula. Aí o motim, às nove da manhã de sexta-feira, aproximadamente.

Em parte, cobertos de razão. Como é que alguém vem e diz que a língua é um instrumento de comunicação, e que a sala de aula pode ser rica, e que eles vão escrever textos bárbaros ao fim do semestre, logo agora no final do curso quando já acreditavam não poder fazer nada, não confiar em ninguém.

Portanto falei coisas indignas. Sem querer abusar da Clarice, tirei a terceira perna e esbravejaram. No conto estudado, uma menina tem uma epifania - cada vez mais detesto essa palavra, o que ela teve em português foi um puta enjôo - por que descobre que o professor acreditou nas tolices dela.

Não foi uma epifania, foi mais um motim mesmo, com líderes de nariz em pé e seguidores mais e menos confiantes. Mas acho que foi como no conto, eu disse que ia acreditar em suas tolices.

sábado, 1 de março de 2008

Professor tem que explicar bem

... mas às vezes eu esqueço disso. Desta vez expliquei direito na primeira aula o que vou fazer ao longo do semestre, e acho que poupei um bom tempo e muitos problemas com isso.
O estranho é que não é simples você dizer o que vai fazer. Precisei de alguns anos para isso. Depois choveram alunos no intervalo com idéias para os projetos, acho que acertei. Será que esse ano não tem motim??

O processo por plágio continua, já está uma pasta pesada. Impressionante como a burocracia universitária, como um Midas reverso, consegue transformar um plágio documentado em um importúnio ao professor.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

O primeiro emprego

Ele disse que não colocava negro no açougue pois as clientes não iam comprar carne.

Eu não estava preparada para ouvir isso. Era meu primeiro emprego, tinha 21 anos, era dezembro de 1989. Não era na Vila Maria, era lá na Avenida Angélica, onde uma vez assaltaram e não pegaram nada da minha mãe pois de avental de professor passou por indigente.

O açougue não tinha ventilação, e aquele filme plástico embalando as carnes, rompido por uma linha de metal aquecido, soltava um cheiro nauseante. Então em meus relatórios, no programa de trainee do Pão-de-Açúcar, apareciam essas coisas: a falta de ventilação, de equipamentos, de ética.

No Brasil, lembrem, o muro de Berlim ainda demoraria uma década para ser derrubado. Não sei precisar quando foi; eu estava no exterior e não saiu nos jornais. Talvez em outras empresas ainda houvesse racismo institucionalizado, talvez não. Não sei.

E na escola não me ensinaram nada. Quando digo nada, digo absoluta e completamente nada. Nem os que ensinavam modelos matemáticos, nem os que ensinavam história, nem os que ensinavam el derrumbe del capitalismo.

Mas no Pão-de-Açúcar fiz minha primeira “ethnographic field research”, usando entrevistas semi-estruturadas e observação participativa, como às vezes indico em pedidos de bolsa para a Fapesp.

Na Panamericana havia um gerente negro, de nível cultural acima dos outros gerentes que eu havia conhecido. O que aquele homem deve ter feito para chegar onde chegou eu nem sei, a Panamericana era um lugar privilegiado. Lá fiquei bastante tempo, fiz amizade com um menino meio atrapalhado que militava pelo PC do B, e que foi demitido enquanto eu estava lá.

Perguntei ao gerente, super doce e sem acusação: “Escuta, e o Fulano, ele foi demitido por que era do PC do B?” O gerente, que queria agradar aos trainees, e com quem eu tinha me dado especialmente bem, negou, muito tranquilo. “Imagine, ele era todo atrapalhado, foi por causa do serviço. Aqui a gente não persegue ninguém, só queremos o serviço bem feito.” Ele conhecia meus valores, e emendou para seu braço direito: “Cicrano, o Fulano, por que a gente demitiu?”

“Ah, por causa da política. PC do B é pobrema né?” Fiquei constrangida, eu gostava do gerente. Mas a vida não é simples e manter aquele cargo devia ser um malabarismo diário.

No shopping Iguatemi eu curti, pois me enfiei na peixaria e aprendi a cortar filés. Os peixeiros ficaram admirados com minha destreza, ganhei um respeito. Eu tendia a simpatizar mais com os trabalhadores e menos com os gerentes, via esses últimos como aquele tipo de gente que subiu um degrau e já faz gosto em pisar nos debaixo.

Não sei se era meu marxismo, se era a educação de meus pais que também tinham nojo da mediocridade. Ainda tenho um pouco desse sentimento, nojo de pesquisador que leu um livro, de rico que doa roupa usada (ao contrário dos americanos que doam bibliotecas gigantes), penso nos gerentes do Pão-de-Açúcar do final dos anos 80.

O muro não tinha caído, nem para mim. Eu podia, se tivesse tido maturidade ou instrução, sentado ao lado do chefe e dito: “Essa empresa tem umas coisas que se virarem públicas será terrível. Quero ser o ombudsman interno, coletar informação e ajudar a diretoria a lidar com eles.”

Mas não falei nada, só continuei enviando meus relatórios. Então me disseram: “Você, o Ricardo e o Renato são a nata do programa. E a nata a gente joga fora.”

Depois ainda havia as grávidas, que não podiam ficar de pé e sentavam-se todas em torno de uma mesa de madeira, descascando alho. E o sujeito que, da origem dos produtos que recebia, só sabia o seguinte: “vêm do fornecedor.”

Isso eu tinha aprendido com Marx, era a tal alienação. Mas numa São Paulo já afluente me parecia um desperdício de vida, me doía a alma.

E numa loja da periferia, onde nos fundos havia um refrigerador desligado repleto de moscas, e à disposição dos clientes danones vencidos, descobri que eles contratavam justiceiros para se livrar dos meninos que roubavam whiskey.

Bem, até agora você me achou fresca, aos 21 anos não aguentar umas mulheres descascando alho. Mas justiceiros era demais, e pedi demissão. Um coordenador do projeto pediu para eu ficar, ficou horas me explicando que a empresa queria mudar e precisava de gente como eu.

Aceitei. Mas o outro grupo tinha ficado contente com meu pedido, e então fui demitida no dia seguinte.

O Renato me disse: eles tinham falado dos justiceiros numa palestra lá na Berrini, não lembra? Não, eu não lembrava. Como disse, eu não estava preparada para ouvir.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

FEA-USP


Aqui vai uma foto que retrata tão bem a escola onde estudei, a FEA-USP, no olhar de uma grande amiga, Karla Krepsky.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Os Salles de Santiago

Vi Santiago ontem, no Espaço Unibanco. É um pouco redundante isso, ver um filme de João Moreira Salles no cinema do “banco de papai”. Mas gosto do espaço Unibanco, e se algum dia ganhar na loteria vou botar o dinheiro no Unibanco, acho chique.

Quando vi o diretor numa palestra na Unicamp, uns anos atrás, achei o moço de uma educação, de uma delicadeza impressionante. Fiquei com a impressão de que talvez fosse nobre mesmo. De que nascer em berço de ouro, apesar dos meus marxismos e de minhas histórias de imigrantes, nos fizesse gente melhor.

Então me caiu o queixo escutar sua voz ríspida – e a de uma mulher que ele apresenta como amiga – se dirigindo ao idoso Santiago, antigo mordomo da casa de seus pais. O filme é sobre essa rispidez, que ao final Joãozinho expõe ao nosso riso, e sobre a qual ao longo do filme reflete.

Mas refletir sobre a rispidez não o exime de nada. Ela está lá, o tempo todo, diga isso, encoste a cabeça aqui, agora não, isso não, então diz. Aos meus alunos digo que é preciso escutar. Não dou Derrida nem Peirce, para não ficarem escutando fantasma de filósofo. Digo para abrirem os olhos e manterem as orelhas de pé. Digo para formularem questões só pra conduzir a conversa. Prometo que todos vão querer falar com eles, e que não é preciso interpretar nada pois as pessoas têm compulsão a dizer a verdade.

E eles me vêm com aqueles trabalhos divertidos.

Como é que um documentarista, e ainda por cima nobre, não soube escutar?

Aí talvez valham as histórias de imigrantes. “Shemá Israel”, escuta povo de Israel, é um mandamento ético. Escutar é algo solene. Nessa reza acho que Israel escuta Deus, e às vezes Deus escuta Israel, mas um pouco desse escutar divino está em cada escuta, em cada ato de parar o mundo e tentar adivinhar o que um outro é decifrando os sons que emite.

O filme também é sobre nobreza, e esse é o pulo do gato. Santiago era fissurado pelas nobrezas, todas, antigas, medievais, indígenas, sobretudo européias. Sonhou ser nobre na França, em plena revolução, diz o filme. Ao final do documentário vislumbramos um resto de gente nesse Santiago. O diretor abre uma pequena janela, e o filme fecha.

Mas faltou mesmo o pulo do gato. Faltou não apenas revelar Santiago como olhar o mundo com seus olhos – também procuro ensinar isso aos alunos, não é fácil, ver o mundo com os olhos do outro. E os olhos de Santiago mostrariam uma nobreza capenga, mamãe, papai e seus presidentes depostos, Joãozinho, o calor do Rio de Janeiro. Ou talvez até uma nobreza nobre, como a que vi na palestra da Unicamp, não sei. Mas queria saber quem eram os Salles no olhar de Santiago.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

76 alunos

Queria empurrar todas as minhas aulas para o segundo semestre e passar o primeiro pensando na vida; não deu.

Como teria que ir para Araraquara anyway, acabei oferecendo uma optativa, batizei de mídia e globalização.

76 alunos se inscreveram. O site já está pronto. Às vezes entro nele, ainda vazio. Em um mês haverá 76 alunos lá. Talvez menos, acho que quando eu explicar o que é o curso, e dizer que não basta ter lido uma vez um artigo na Caros Amigos sobre o assunto, um povo vai sair.

Mesmo assim, 76 me impressionou. Quem são? O que esperam? O que vão exigir de mim, como se assim fazendo exigissem do mundo?

76 vozes, jeitos de escrever, comportamentos em aula. Nunca dei um curso para tanta gente. Juntos, vão virar uma pasta indistinta? Ou ainda haverá o atento do fundo, o radical que não lê os textos, o tímido que desabrocha, a menina enfadada?

Faço contas: se eu mantiver o número de alunos por grupo, periga ter 25 trabalhos para orientar. Assusto eles na primeira aula, digo que o curso reprova? Ou encaro como se fosse um passeio?

Vou fingir que está tudo sob controle. Que quem carrega um arenque carrega um menir. Vou entrar na sala de aula no piloto automático, vou rezar para ter 76 assistentes.